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Outubro de 2025 - #3 A vida são 2 dias...de dalbavancina?

No substack: esFOAMeados No patreon: esFOAMeados Em podcast: Hipótese Nula


Gerado por Perplexity
Gerado por Perplexity

TABELA DE CONTEÚDOS


SINOPSE


🎂 Nata da nata

- Anti-agregação simples --> Clopidogrel > AAS

- Insónia --> TCC-I bastante eficaz em pop. c/ doença crónica - deveria ser a norma e não a excepção? (JAMA IntMed)


🍰 Nata

- Bacteremia SA --> Dalbavancina não-inferior a tto padrão depois de clearance após 3-10d (DOTS, JAMA)

- HTA --> Desprescrição de anti-HT no idoso frágil reduz fármaco sem alterar mortalidade (RETREAT-FRAIL, NEJM)

- Anti-agregação dupla --> Suspender AAS 4d pósICP foi precoce...mas não pósCABG e 1M pósICP(3 ECAs, NEJM)

- LES --> Telitacicept é novo fármaco dirigido, muito eficaz mas também menos seguro (18C010, NEJM)

- Neo esofágica --> Esofagectomia toracoscópica parece não-inferior a aberta (JCOG1409 MONET Lancet G&H)

- DRC5d --> Esprionolactona não melhorou desfechos e aumentou hiperK (ACHIEVE, Lancet)

- Cefiderocol --> Resultados muito pouco animadores. Falta população certa? (GAME CHANGER, Lancet ID)

- DAP --> Paclitaxel sem benefício (e até possível malefício) na angioplastia infra-inguinal (SWEDEPAD, Lancet)


🧐 Observações

- Primários: Vertigem e Sudbury Vertigo Risk Score (AEM)


Opiniões

- Revisão narrativa: Novo coneito: raciocínio de gestão (AEM)


🌎FOAMed

Novas guidelines americanas de hipertensão (NephJC)



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REVISÕES SISTEMÁTICAS de ECAs

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Cardiovascular

n = 28,982 / 7 ECAs; 45% pós-SCA, 80% pós-ICP), seguimento mediano 2.3 anos; análise prolongada a 5.5 anos

P — Doença coronária estável ou SCA recente   +   Sem antiagregação dupla

I — Clopidogrel 75 mg/dia em monoterapia

C — Aspirina 75–325 mg/dia em monoterapia

O 1º » MENOR MACCE (morte CV + EAM + AVC) – 2.61 vs 2.99 eventos/100 p-ano; HR 0.86 (IC95% 0.77–0.96); p=0.008

- RRA 0.38/100 p-ano → NNT ≈ 263-ano

   - Redução dominada por menos EAM não-fatal – OR 0,73 (0,60–0,90); p = 0,01

   - Tendência para menos AVC isquémico – OR 0,86 (0,74–1,00); p = 0,05

     - Igual morte CV – OR 0,93 (0,74–1,21); p = 0,64

    2º » Igual hemorragia major – 0.71 vs 0.77/100 p-ano; HR 0.94 (0.74–1.21); p = 0.64

        Igual mortalidade total (HR 0.93; NS)

Subgrupos: efeito consistente no sexo, idade, apresentação coronária ou factores de risco

Heterogeneidade: Sem heterogeneidade inter-ensaios (p interacção > 0.1)

Comentário: A “aspirina” (mais correctamente, o ácido acetilsalicílico) tem sido o pilar clássico da prevenção cardiovascular. O clopidogrel, inibidor P2Y₁₂ (mais específico e sem bloqueio COX-1 gastrorrenal), tem sido utilizado sobretudo como adjuvante à aspirina na anti-agregação dupla temporária, tem vindo a ganhar prova nos últimos ensaios de não-inferioridade ou até superioridade em relação à “velhinha” AAS. Nesta RS com MA, houve realmente um ganho absoluto mas modesto (NNT elevado) com o clopidogrel, à custa da diminuição de EAM não-fatal. Apesar disso, não chegou a ser demonstrada vantagem clara de segurança, apesar de haver tendência numérica para tal e o número de eventos ser demasiado pequeno. Incerteza quanto à custo-efetividade ainda por demonstrar, mas o preço do genérico do clopidogrel aproxima-se do custo do AAS. Atenção que 3 dos 7 ECAs são em doentes pós-ICP com suspensão precoce de aspirina, limitando a validação externa a todos os doentes. Por último, curiosamente, nos doentes em que houve análise genética de perda de função CYP2C19 (o clopidogrel é um pró-fármaco que precisa de ser metabolizado para se tornar activo), parece que essa perda de função não anulou vantagem, sugerindo benefício populacional amplo; mesmo assim, em portadores 2/2 uma DAPT curta ou P2Y₁₂ alternativo continua racional.

Nota: quantos mais ECAs e RS&MA teremos sobre este tema? diria que talvez já chega, mude-se a prática e pronto...

Conclusão: Na monoterapia da DAC crónica, clopidogrel não é pior que AAS (e talvez, no geral, melhor).


Neurologia

67 ECAs, n = 5.232; pesquisa até  Jun ; publicado online a  Set .

P — Adultos com doença crónica e insónia - incluindo cancro, dor crónica, síndrome do intestino irritável e acidente vascular cerebral.

I — Terapia cognitivo‑comportamental para insónia (TCC‑I) em múltiplos formatos e durações, com enfâse em gravidade, eficiência e latência

C — Controlos diversos (cuidados habituais, psicoeducação ou intervenções activas)

O » MENOR gravidade de insónia: g = 0,98 (IC95% 0,81–1,16) muito a favor de TC-I

    » Maior eficiência do sono: g = 0,77 (IC95% 0,63–0,91) a favor de TC-I

    » Menor latência de início do sono: g = 0,64 (IC95% 0,50–0,78) a favor de TC-I

pequeno,  médio,  grande, limiares são contextuais      - Tratamentos mais longos: ganhos em eficiência e latência; eficácia semelhante em vários subgrupos     - Aceitabilidade: abandono médio ; satisfação elevada; EAs raros.

Comentário: Efeitos moderados a grandes em desfechos subjectivos de sono, com aceitabilidade robusta e sinal consistente em várias doenças crónicas, mas com heterogeneidade metodológica e de comparadores que recomenda prudência na extrapolação universal e atenção à dose /  “pacote terapêutico”. Evidência complementar sugere que componentes como reestruturação cognitiva, “third‑wave”, restrição do sono e controlo de estímulos, especialmente em formato presencial, podem potenciar o efeito observado nos ensaios agregados. A durabilidade dos efeitos é plausível, mas pode atenuar ao longo de meses, reforçando a necessidade de seguimento e de estratégias de manutenção adaptadas ao contexto de doença crónica.

Conclusão: TCC-I parece eficaz e aceitável em populações com doença crónica




ENSAIOS CONTROLADOS E ALEATORIZADOS

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Cardiovascular

n = 1 048; pragmático; multicêntrico em lares em França; Público/Académico; seguimento mediano 38,4 meses

P — Residentes em lar ≥80 anos com fragilidade, >1 anti‑hipertensor e PAS <130 mmHg.

I — Estratégia protocolada de redução progressiva de anti‑hipertensores (step‑down).

C — Cuidados habituais (usual care).

O 1º » IGUAL mortalidade por todas as causas: 61,7% vs 60,2%; HR 1,02 (IC95% 0,86–1,21); p=0,78.

    2º » Maior redução do número de fármacos mais acentuada no step‑down: 2,6→1,5 vs 2,5→2,0.

         » Maior (ligeiro) aumento da PAS: dif. méd. ajustada +4,1 mmHg (IC95% 1,9–5,7).

         » Semelhantes eventos adversos

Comentário: Ensaio pragmático em tema de desprescrição, concluiu que reduzir anti‑hipertensores em muito idosos frágeis com PAS já <130 mmHg diminuiu polifarmácia sem piorar ou melhorar sobrevivência e elevou ligeiramente a PAS — efeito que parece clinicamente modesto e sem tradução ao que mais nos importa, desfechos clínicos orientados ao doente. Uma grande limitação que vejo foi a de que o grupo de cuidados habituais também reduziu medicação (2,5 para 2,0), apontando para algum viés de desempenho – possivelmente efeito de Hawthorne - aproximando os grupos e tornando improvável detectar benefício. Por um lado, a ausência de ganhos em desfechos “duro” e longo seguimento impõe prudência perante desprescrição sistemática…por outro, se parece ficar tudo na mesma, mais vale fazer a menos do que a mais (até porque, como sabemos, os efeitos adversos são potencialmente mascarados em ambiente de ensaio). Com isto, diria que a aplicação dos resultados deve ser individualizada e priorizar desfechos orientados ao doente de eficácia e segurança (sintomas de hipotensão, quedas, função, objetivos de cuidados) em vez de perseguir acerrimamente baixar PAS no idoso frágil só porque sim.

Conclusão: Em residentes frágeis ≥80 anos com PAS <130 mmHg, step‑down terapêutico reduziu a carga medicamentosa sem diferença na mortalidade.


n = 512; multicêntrico, Itália; seguimento 12 meses; financiamento público (Ministério da Saúde italiano)

P — Idosos com desempenho físico diminuído 1 mês após EAM

          Basal: mediana 80 anos; 36% mulheres.

I — Reabilitação “multidomínio”: controlo agressivo de FRV, aconselhamento dietético e exercício supervisionado

C — Cuidados habituais

O 1º » MENOR composto de morte cardiovascular ou internamento CV não‑planeado em 1 ano: 12,6% vs 20,6%; HR 0,57 (IC95% 0,36–0,89); p=0,01.

    2º » Menor? morte CV: 4,1% vs 5,9%; HR 0,69 (IC95% 0,31–1,55) — não significativo.

         » Menor internamento CV não‑planeado: 9,1% vs 17,6%; HR 0,48 (IC95% 0,29–0,79).

         » Segurança: sem eventos adversos graves atribuídos à intervenção.

Comentário: Sinal robusto no desfecho primário, mas a maior parte do benefício vem da redução de internamentos — componente mais susceptível a viés de desempenho/seguimento num ensaio aberto de reabilitação, onde há mais contactos e gestão proactiva no braço intervenção. Além disso, é sempre (ou deveria ser) imprescindível se o efeito se mantém para os internamentos totais. A ausência de redução significativa de morte CV em 12 meses sugere benefício sobretudo “de processo/cuidados” e requer prudência ao extrapolar para mortalidade. Ainda assim, em octogenários frágeis pós‑enfarte, menos internamentos, se forem proporcionais aos internamentos totais, é clinicamente relevante. Generalização fora de centros com equipas de reabilitação estruturadas e aderência elevada pode atenuar o efeito. A relação custo‑recursos vs ganhos em utilização de cuidados merece avaliação local.

Conclusão: Em idosos frágeis 1 mês após enfarte, reabilitação multidomínio reduziu eventos CV compostos à custa de menos internamentos.


n = 3 410; aberto, multicêntrico no Brasil; 12 meses; financiamento público

P — SCA após PCI bem‑sucedida (até 4 dias depois)

I — Monoterapia com inibidor P2Y12 “potente” (ticagrelor ou prasugrel)

C — AAgD 12 meses (aspirina + inibidor P2Y12 “potente”).

O 1º » Não-inferioridade NÃO CUMPRIDA para composto isquémico a 12 meses (morte, EAM, AVC, revascularização urgente) – 7 vs 5.5%, ARA 1.5% (IC −0.16 a 3.10) / NNH 67; P=0.11 para NI

         » Desfecho composto dominado por mais revascularização – 2.6 vs 1.6 %

   2º » Menos hemorragia maior/clinicamente relevante – 2 vs 4.9%, RRA 2.9% (IC −4.20 to −1.73) / NNT 34

        » Mais? trombose de stent – poucos eventos, 12 vs 4

n = 1 942 (de 2 246 elegíveis); 40 centros europeus; 11 meses de seguimento

P — EAM de baixo risco, totalmente revascularizado e 1 mês livre de eventos sob AAgD.

I — Monoterapia com inibidor P2Y12 por mais 11 meses.

C — Continuação de AAgD por 11 meses.

O 1º » Não-inferioridade CUMPRIDA para composto (morte, EAM, trombose de stent, AVC ou hemorragia maior BARC 3-5) – 2.1 vs 2.2 %

    2º » Menos hemorragia clinicamente relevante (BARC 2/3/5) – 2.6 vs 5.6 %, RRA 3% / NNT 33

         » Semelhante e rara trombose de stent

n = 2 201; aberto; 22 centros nórdicos; 12 meses

P — Doentes submetidos a CABG por SCA.

I — AAgD com Ticagrelor + aspirina por 12 meses.

C — Aspirina isolada por 12 meses.

O 1º » IGUAL composto (morte, EAM, AVC e revascularização) – 4.8 vs 4.6 %

    2º » Mais hemorragia major – 4.9 vs 2 %, ARA 2.9 % / NNH 34

         » Pior desfecho clínico líquido – 9.1 vs 6.4 %, ARA 2.7 % / NNH 37

Comentário:

  • O conjunto de 3 ensaios que caíram em amálgama na ESC 2025 e no NEJM clarifica o espectro “quando” e “em quem” retirar aspirina: retirar demasiado cedo, logo nos primeiros dias pós‑ICP em SCA não‑seleccionado (NEO‑MINDSET), falhou a não‑inferioridade para eventos isquémicos à custa de mais revascularização e levantou sinal para mais trombose de stent — reforça que o primeiro mês continua a ser território de AAgD, sobretudo com P2Y12 potente.

  • Já em doentes cuidadosamente seleccionados, com EAM de baixo risco, revascularização completa, 1 mês inicial sem eventos e stents contemporâneos (TARGET‑FIRST), a transição para monoterapia P2Y12 manteve eventos isquémicos muito baixos e reduziu hemorragia clinicamente relevante — aqui parece haver verdadeira margem para desescalar.

  • No CABG por SCA (TACSI), acrescentar ticagrelor à aspirina durante 1 ano não trouxe benefício isquémico e aumentou hemorragia, piorando o “net clinical benefit” — a fisiologia do enxerto e o risco hemorrágico cirúrgico parecem pesar contra DAPT sistemática neste cenário.

  • Notas metodológicas: todos os ensaios são abertos e com desfechos primários compósitos que misturam desfechos diferentes, alguns comparando isquémia e hemorragia - a interpretação deve privilegiar componentes “duros” e coerência biológica. Mesmo no pior cenário, o malefício parece ser sobretudo à custa de maior revascularizações e trombose de stents, sem aparente sinal claro nos desfechos mais relevantes e orientados ao doente.

  • Implicação prática acreditando nestes resulados:

    • Primeiros 30 dias pós‑ICP em SCA não‑seleccionado à manter AAD padrão com aspirina + iP2Y12 potente.

    • Após 1 mês, se baixo risco isquémico e alto/moderado risco hemorrágico, considerar monoterapia iP2Y12 e suspender aspirina.

    • Após CABG por SCA, manter aspirina isolada e reservar AAD para indicações específicas (ex.: enxertos arteriais com complicações, anatomia de altíssimo risco), avaliando risco hemorrágico.

Conclusão: Retirar aspirina “cedo demais” no SCA geral pós‑ICP (4 dias) pode ser demais. Contudo, no EAM de baixo risco após 1 mês e no pós-CABG, a monoterapia iP2Y12 é uma opção não‑inferior e menos hemorrágica.


Cirurgia, Ortopedia & MFR

n = 2 355; ocultação, 22 centros suecos; seguimento mediano 2,7 anos

P — Isquémia de membro inferior - Rutherford 4-6 - com plano de angioplastia infra-inguinal

I — Balões/stents revestidos com paclitaxel

C — Balões/stents não-revestidos

O 1º » IGUAL amputação maior ipsilateral – HR 1,05 (0,87-1,27); p = 0,61

    2º » IGUAL mortalidade total – HR 1,04 (0,92-1,17); p = 0,54

n = 1 136; ocultação, 22 centros suecos; seguimento mediano 7,1 anos

Paclitaxel-coated versus uncoated devices for infrainguinal endovascular revascularisation in intermittent claudication

P — Claudicação intermitente - Rutherford 1-3 - com plano de angioplastia infra-inguinal

I — Balões/stents revestidos com paclitaxel

C — Balões/stents não-revestidos

O 1º » IGUAL qualidade de vida (VascuQoL-6 a 1 ano) – Δ -0,02 (-0,66 a 0,62); p = 0,96

    2º » Igual/PIOR mortalidade: 5 anos – HR 1,47 (1,09-1,98); p=0,01 | 7,1 anos – HR 1,18 (0,94-1,48); p=0,16

Comentário: Estes dois grandes ECAs pragmáticos, com ocultação para os doentes e ancorados no (reconhecidamente bom) registo nacional sueco, mostraram nenhum benefício clínico relevante com revestimento de stents com paclitaxel na angioplastia de membros inferiores: nem menos amputações na isquémia crónia nem melhor qualidade de vida na claudicação intermitente. Pior: no ECA de claudicação (SWEDEPAD 2) surgiu um sinal preocupante de aumento de mortalidade aos 5 anos, embora se dissipe aos 7 anos. Isto, aliado a custos superiores e ao histórico de alerta de mortalidade em meta-análises anteriores, enfraquece ainda mais o argumento a favor destes dispositivos no presente.

Conclusão: Na revascularização infra-inguinal, os dispositivos revestidos a paclitaxel não oferecem vantagem funcional ou sintomas e até podem aumentar mortalidade.


Imuno-mediadas

n=335 (433 rastreados); duplamente‑oculto, China; 52 semanas; financiado pela RemeGen

P — Adultos com LES activo sob terapêutica de base.

I — Telitacicept 160 mg SC semanal (inibidor duplo BLyS/APRIL) por 52 semanas, + terapêutica padrão.

C — Placebo SC semanal por 52 semanas + terapêutica padrão.

O 1º » MAIOR resposta no SRI‑4 modificado às 52 semanas: 67,1% vs 32,7%; Δ 34,5 %; p<0,001.

    2º » Maior redução ≥4 pontos no SELENA‑SLEDAI: 70,1% vs 40,5%; Δ 29,6 %.

         » Mais EAs relacionados com terapêutica - 74,9% vs 50,0%, ARA 24,9% / NNH 4

          - Mais IRTS 31,7% vs 19,0%, ARA 12,7% / NNH 8; Mais reacções locais 6% vs 0,6%, ARA 5,4% / NNH 19

          - Mais hipogamaglobulinémia - IgG (15,6% vs 1,2%) e de IgM (15,0% vs 0,6%);

Comentário: O telitacicept é uma nova proposta para o LES: é uma proteína de fusão TACI‑Fc que neutraliza simultaneamente BAFF/BLyS (estimulador de citocinas-B) e APRIL (ligando indutor de proliferação), bloqueando sinais essenciais para maturação de B, diferenciação em plasmócitos e sua sobrevivência (via TACI/BCMA), o que reduz autoanticorpos e imunoglobulinas séricas – uma espécie de belimumab (anti-BAFF) mais abrangente. Efeito absoluto invulgarmente grande para LES em desfechos de actividade (SRI‑4/SELENA‑SLEDAI), coerente com o alvo B‑celular BLyS/APRIL. No grupo placebo foram permitidos AINEs, glucocorticóides (com tecto diário e possibilidade de pequeno aumento inicial e desmame), hidroxicloroquina e imunossupressores convencionais (ex.: micofenolato, azatioprina, metotrexato, tacrolimus/ciclosporina), com janelas de ajuste pré‑definidas, e a taxa de resposta elevada no placebo foi compatível com terapêutica aparentemente optimizada no grupo de controlo. Comparando com os outros new kid on the block belimumab e anifrolumab, a magnitude de eficácia parece ser maior (o dobro até…mas cuidado com comparações indirectas, a população pode não ser igual). Porém, continuam em falta dados de “valor clínico” a médio‑longo prazo - poupança de corticóide/terapêuticas, flares, dano cumulativo, qualidade de vida. A redução de imunoglobulinas e mais infecções respiratórias superiores pedem cautela com provável atenção a infecções, monitorização de Ig e plano vacinal. Novamente comparando com os outros dois, este parece ter mais eventos adversos (faz sentido pelo mecanismo menos selectivo). Por último, a generalização além do contexto chinês requer confirmação, idealmente com análises por fenótipo (nefrite, cutâneo‑articular) e estratégias de redução de corticóide.

Conclusão: Telitacicept melhorou significativamente a actividade do LES aos 12 meses à custa de maior risco de infecções e hipogamaglobulinemia.


Infecciologia, Microbiologia & Antimicrobianos

n = 200; aberto, avaliadores ocultos; 23 centros (EUA/Canadá); 2021–2023; follow‑up 70 dias (180 dias se osteomielite)

P — Hospitalizados com bacteriemia por SA complicada, após clearance de HC entre ≥72 h até ≤10 d de abt inicial

excluídos SNC, prótese infectada retida, endocardite esquerda, imunodepressão grave. 

I — Dalbavancina 1 500 mg EV dia 1 e dia 8 (2 doses).

C — Terapêutica padrão EV 4–8 semanas: SAMS cefazolina/penicilina anti‑estafilocócica; SAMR vanco/daptomicina.

O 1º » NÃO SUPERIOR eficácia (DOOR) aos 70 dias

  • probabilidade de desfecho mais favorável com dalbavancina 47,7% (IC95% 39,8–55,7) — não superior a standard.

    2º » Não-inferior eficácia clínica aos 70 dias: 73/100 vs 72/100; dif.1,0% (−11,5 a 13,5) — cumpre NI (margem −20%).

         » Igual qualidade de vida

         » Semelhantes EA graves: 40/100 vs 34/100 | Menos descontinuação por EA (3 vs 12)

Comentário: A dalbavancina é um glicopeptídeo semisintético com muito potencial pois, na teoria, bastam apenas 2 doses. A pergunta seria se também funcionaria na bacteremia. Como “step‑down” após hemocultura negativa da bacteremia por SA (BSA) complicada, dalbavancina não foi superior num desfecho global que pondera eficácia, complicações infecciosas, segurança, mortalidade e qualidade de vida, mas foi não‑inferior em eficácia clínica binária. Leitura: alternativa viável quando o objetivo é evitar internamentos e acessos EV prolongados, permitindo alta e/ou OPAT precoce, sem esperar melhoria de desfechos duros. A eficácia global (DOOR) pode ter sido “travada” por ausência de ganho em QdV e EA semelhantes, além de alguma perda de dados tratada como falha terapêutica. Foram excluídas situações de alto risco (inf. de SNC, endocardite esquerda, prótese retida), pelo que os resultados não se aplicam a esses cenários. No final de tudo, estando no mundo de transição para antibioterapia oral cada vez mais precoce, pergunto-me se a dalbavancina será muito melhor que transição para abt oral – esse seria o próximo ECA que gostaria de ver!

Conclusão: Na BSA complicada pós‑clearance, 2 adminstrações de dalbavancina EV nos dias 1 e 8 pode ser opção não‑inferior.


n = 504, aberto, não‑inferioridade (margem 10%), superioridade testada se NI cumprida; 17 hospitais terciários (Ásia e Oceânia); 2019–2023; Universidade de Queensland, Shionogi, Henderson Foundation e NMRC Singapura.

P — Bacteriemia por bacilos gram‑negativos nosocomial (hospital ou cuidados de saúde) pré-antibiótico

I — Cefiderocol 2 g EV tid, com ajuste por protocolo e acompanhamento até 90 dias

C — Terapêutica padrão escolhida pelo clínico (best available therapy), estratificada por região e comorbilidades

O 1º » NÃO‑INFERIOR em mortalidade por todas as causas aos 14 dias: 8% vs 7%; dif. 1% (IC95% −3 a 6)

Sem superioridade – sinal para inferioridade?

    2º » Não-inferior? no subgrupo carbapenemo‑resistente (CR): 14% vs 10%; dif. 5% (−7 a 16)

Sem superioridade - sinal para inferioridade?

         » Mais EA graves de delirium, prostração, calafrios, alt. enzimologia hepática, exantema; perfil global semelhante

Comentário: Ensaio pragmático, mas aberto e com controlo heterogéneo “à discrição”, o que pode diluir diferenças e introduzir vieses de co‑intervenções. Além disso, mortalidade aos 14 dias pode ser um desfecho precoce para infecções graves, e a imputação de dados pode influenciar estimativas marginais perto de zero. A ausência de superioridade no conjunto e no subgrupo CR, com tendência numérica para mais mortalidade com cefiderocol, sugere que este fármaco, na teoria uma alternativa muito promissora, afinal pode não ser assim tão maravilhoso. Em suma, até pode ser um bom plano de reserva quando há risco ou confirmação de Gram‑negativos multirresistentes, mas sem sinal para que seja utilizado como rotina quando a terapêutica dirigida é apropriada, nem sequer quando já sabemos que são CR. Por último, não podemos deixar escapar a ironia do título "GAME CHANGER". Na verdade, a mudança no jogo foi emprestar o jogador esta temporada e esperar para ver se rende mais na próxima.

Conclusão: Cefiderocol foi não‑inferior à terapêutica padrão na mortalidade aos 14 dias em bacteriemia hospitalar/associada a cuidados de saúde por gram‑negativos, mas não superior e sinal para mais mortalidade.


Nefrologia

n = 2 538 (após run‑in aberto, inicialmente n = 3 565); duplamente‑oculto; internacional em 143 centros/12 países; Público/Académico; 2017–24; terminado por futilidade

P — Adultos em diálise de manutenção ≥3 meses (≥45 anos ou ≥18 com diabetes), aderentes após run‑in com espironolactona

I — Espironolactona 25 mg - início 3x/S, titulação até qd; co‑intervenções (resinas, ligantes de K, Kno dialisado) à discrição local

C — Placebo correspondente

O 1º » IGUAL tempo até 1.º evento de MCV ou internamento por IC — HR 0,92 (IC95% 0,78–1,09)

mediana follow‑up 1,8 anos; paragem por futilidade após ≈508 eventos.

    2º » Iguais mortalidade geral, mortes cardíacas/vasculares, internamentos (IC e todos)

        » Mais hipercaliemia grave com espironolactona, apesar do do run‑in prévio com exclusão de 10% por hiperK

        » Sem novo sinal de hipotensão clinicamente relevante.

Comentário: Após anos de pequenos estudos com riscos de viés e efeitos “bons demais”, um ECA robusto, com run‑in que até favorecia a intervenção (só entra já quem tolera e adere), falhou em reduzir morte, morte CV e internamentos por IC. A probabilidade de benefício real é baixa quando, até num cenário “ideal”, o efeito não aparece. O desfecho duro é relativamente adequado…,mas eu teria preferido primário de mortalidade apenas (resultado teria sido diferente?). Pode-se argumentar que a biologia torna improvável que um ARM de curto/médio prazo reverta décadas de remodelação/fibrose. Na verdade, os doentes com DRC5d morrem na sua maioria de infecção ou outras não directamente relacionadas com o benefício da ARM, podendo explicar. O aumento de hipercaliemia mesmo após excluir cerca de 10% por hipercaliemia no run‑in, reforça o risco iatrogénico.

Conclusão: Em doentes em diálise, espironolactona não melhorou desfechos clínicos e aumentou hipercaliémia


Oncologia

n = 300; aberto, NI; 31 hospitais no Japão; Público (AMED/NCC); 2015–23 c/ 2 interinos planeados

P — 20–80 anos, Carcinoma esófago torácico ressecável (CEC, adenoescamoso, basalóide), ECOG 0–1, estádios I–III (exclui T4)

sem terapêutica prévia excepto ressecção endoscópica superficial e QT NeoA per guidelines.

I — Esofagectomia toracoscópica direita com linfadenectomia pelo menos D2.

C — Esofagectomia aberta transtorácica direita com pelo menos D2.

O 1º » NÃO‑INFERIOR sobrevida global aos 3 anos: 82,0% vs 70,9%; HR 0,64 (IC98,8% 0,34–1,21); p NI (unilateral)=0,000726 (< limiar 0,00616)

    2º » Não-inferior/Melhor sobrevida livre de recidiva aos 3 anos: 72,9% vs 61,9%; HR 0,68 (IC95% 0,46–1,01)

Se R0, 95,3% vs 90,0%.

         » Semelhantes complicações ≥G3: intra‑op 1% vs 1%; pós‑op 42% vs 44%

         » Menos pneumonia ≥G3 8% vs 12%; Mais fístula anastomótica ≥G3 11% vs 5%; óbitos relacionados 4 vs 2.

Comentário: Ensaio NI pragmático e multicêntrico, desfecho primário “duro”, mostra pelo menos equivalência em SG (e talvez superioridade) e sinais favoráveis em SLR. Porém, aberto, com curva de aprendizagem e diferenças técnicas potenciais entre centros, além de mais fístula ≥G3 na via toracoscópica, o que pesará na escolha do doente e do centro. A suspensão após a 2.ª análise interina por NI atingida é razoável, mas os desfechos secundários, nesse caso, tornam‑se nominais (ainda mais hipotéticos que o que já são habitualmente). Apesar de sinal para entusiasmo com esta técnica menos invasiva, a generalização fora do Japão – fora de centros com casuística elevada e dissecação D2 de rotina – carece de validação.

Conclusão: Na neoplasia esofágica torácica ressecável, a esofagectomia toracoscópica foi não‑inferior à aberta


ESTUDOS OBSERVACIONAIS

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PRIMÁRIOS - SUB-ANÁLISE / COORTE / CASO-CONTROLO / INQUÉRITOS / A. ECONÓMICAS

Doente crítico/urgente

n = 4 559 adultos (média 78 anos), coorte multicêntrica (3 SU, Canadá)

Introdução: Diferenciar causas graves (AVC/AIT, dissecção vertebral, tumor) das benignas na vertigem aguda continua difícil, com muitos exames imagiológicos pedidos negativos e, ainda assim, AVCs/AITs perdidos na alta – ou seja, dificuldade tanto em sensibilidade com especificidade. O Sudbury Vertigo Risk Score (SVRS) foi derivado para apoiar decisões no SU.

Métodos: Aplicação do SVRS a doentes com queixa de vertigem/tontura/desequilíbrio; desfechos graves adjudicados. Avaliaram‑se curvas de risco por patamar de pontuação.

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Resultados: Eventos graves em 2,3%. Para pontuação <5, risco 0% (sensibilidade 100%; especificidade ~69–72%). Para 5–8, risco ~1–2%. Para >8, risco ~16–17%. Cerca de dois terços dos doentes caíram no grupo <5, grupo onde a TC será potencialmente evitável. O grupo >8 concentrou a maioria dos diagnósticos graves.

Comentário: Como ferramenta de estratificação, o SVRS é promissor: um limiar <5 parece “regra de exclusão” segura e >8 sugere investigação urgente (RM/angiografia), e o patamar intermédio pede observação, reavaliação, exame oculomotor dirigido (p.ex., HINTS por quem sabe fazê‑lo) e eventual consultoria.

Limitações: validação em 3 hospitais do mesmo país, viés de verificação (nem todos fizeram imagem) e um dos pilares do score é o diagnóstico clínico de VPPB, que nem sempre é inequívoco no SU (e faz parte do diagnóstico da síndrome que estamos a avaliar). Útil para racionalizar neuroimagem, mas precisa de validação prospetiva externa e integração com exame vestibular à cabeceira por clínicos treinados.

Nota: Basta que o doente seja homem de >65 anos com diabetes e hipertensão (frequente, como sabemos) para que o SVRS seja >5, pelo que não será útil para todos.



OPINIÃO

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REVISÃO NARRATIVA

Diagnóstico e Raciocínio Clínico

Estes autores – nos quais se inclui o grande Adam Rodman - defendem que, na urgência, o raciocínio de gestão clínica (decidir o que fazer, em que sequência e com que trade‑offs) ocorre em paralelo com o raciocínio de diagnóstico clínico, devendo este ser explícito, pensando, ensinado e avaliado através de management scripts” – guiões de gestão - que integrem incerteza, preferências do doente, constrangimentos do sistema e planeamento de alta/transferência, porque são estes passos que mais frequentemente melhoram os cuidados quando diagnósticos imperfeitos, algo frequente em serviço de urgência.

A proposta é criar guiões por cenários frequentes (ex.: dor abdominal em mulher em idade fértil) que encadeiam opções de exames, tratamentos, consultas e destino, reconhecendo a dependência do caminho (cada decisão condiciona a seguinte) e a existência de múltiplas vias válidas consoante recursos locais e valores do doente.

O artigo sublinha estratégias práticas de mitigação de incerteza típicas de clínicos experientes (precauções de retorno específicas ou “sinais de alarme”, seguimento próximo, admissão sem diagnóstico fechado por elevado risco) e nota que certos diagnósticos “tempo-dependentes” não são resgatáveis por boa gestão, reforçando a necessidade de padrões de gestão e auditoria que vão além da obsessão com “acuidade diagnóstica” isolada.

Para investigação, sugerem formalização computacional do raciocínio de gestão com modelos causais sequenciais, árvores de decisão, redes Bayesianas e processos de decisão de Markov ancorados em dados do mundo real, para revelar padrões, trade‑offs e simular políticas de cuidados na SU.

Para educação, defendem treino escalável com doentes virtuais e ensino explícito dos tais “guiões de gestão” (incluindo avaliação de concordância entre guiões) para alinhar a formação com decisões de alto risco sobre destino e recursos que caracterizam a Medicina de Urgência.

A meu ver, este artigo é bastante original e útil para conhecermos um novo e necessário conceito, mas assenta sobretudo em opinião (fundamentada) com evidência limitada de impacto em desfechos — ponto crítico a priorizar em investigação futura antes de transformar o “raciocínio de gestão” numa métrica de qualidade opaca e rígida e que não esqueça o mais importante, os doentes.



FOAMed

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Cardiovascular

Embora não adore o novo cutoff (andamos para a frente e apara trás, como na canção do Samuel Úria...), gosto, e bastante, das novas recomendações para não se chamar urgência hipertensiva e sim "hipertensão grave sem LOA" (muito mais lógico) e apenas recomendável utilizar medicação anti-hipertensora em SOS se "condições cardíacas" (embora seja vago quanto a que situações, bem melhor do que recomendar a todos!).

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2 comentários


every4 you
every4 you
23 de nov.

Thank you for making my day extra special. -

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Paul Jackson
Paul Jackson
20 de out.

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